sexta-feira, 14 de junho de 2013









Escolhi a Tia Betinha (assim chamada por todos onde residi) por admirar e respeitar sua trajetória educacional e por sua luta para proporcionar as crianças de nossa localidade uma alfabetização de qualidade e acessível.
Nascida em 10/02/1957 no estado de Pernambuco, Clarice Elizabeth Silva de Souza, veio para o Rio de Janeiro aos cinco anos com sua família em busca de uma vida melhor.
         


Sua primeira experiência educacional foi em uma escola de fundo de quintal, onde ela relata ter vivido uma experiência traumática. Onde dona Augusta (a professora) recepcionava os alunos suja e descabelada, e não tinha uma relação amigável com seus alunos. Os agrediam fisicamente ( beliscões, tapas e palmatórias) e os castigavam (ficar de joelhos no caroço de milho) quando não faziam ou acertavam as lições, pediam pra usar o banheiro fora do horário do recreio ou se fizesse algo que não fosse do seu agrado. Diz que a hora de ir pra escola era a pior hora para ela, que chorava e implorava a mãe para não ter que ir para a escola, pois, não tinha o menor prazer em ir aquela escola. Relata ainda ter fugido da dita escola por ter sido posta de castigo de joelhos no milho porque pediu pra ir ao banheiro antes da hora do recreio e por esse motivo urinou na roupa. Constrangida fugiu e não quis mais voltar a essa escola.
Quando entrou em uma escola regular (Escola Supletiva Anexa ao Grupo Escolar Guadalajara) teve muita dificuldade para se relacionar com os professores, pois ainda tinha o trauma da antiga professora  Augusta, e para aprender a ler e escrever. Repetiu várias vezes e quando passava era com notas muito baixas. Até que com 12 anos conheceu a professora Delza, que mudou totalmente sua visão sobre professor. Que até então era que professor era igual a bicho papão. E com muito carinho e paciência a Professora Delza conquistou sua confiança e seu afeto, fazendo com que Clarice aprendesse a ler, a escrever, e fez melhor, fez com que Clarice se apaixonasse pela profissão e um dia viesse a se tornar a Tia Betinha. Concluiu o ensino primário com 15 anos.




Em 1973 ingressou em um supletivo para concluir o antigo ginásio no Centro Educacional Metropolitano, de onde saiu com o diploma e a habilitação em auxiliar de contabilidade. Mais seu sonho era o magistério. Foi então que com muita dificuldade, pois não era comum que mulheres estudassem tanto nessa época, no máximo até o ginásio, adentrou no atual ensino médio para o curso de Formação de Professor de 1° a 4° série do 1°grau no Centro Educacional Guararapes, onde concluiu seus estudos e se formou professora. E na sua formatura pediu a seu Tio um anel de formatura igual o de sua professora Delza, pois tinha dito a ela que quando se formasse teria um anel igual ao dela, e guardou a imagem do anel na memoria.



Uma vez formada teve seu primeiro emprego no Instituto Stela (1979) onde trabalhou por cinco anos. Diz que por muitas vezes tirou do próprio pagamento para comprar peças do uniforme para os alunos, pois a diretora não permitia que estes estudassem se o uniforme não estivesse completo. Havendo mês que ficava sem dinheiro para as próprias despesas pessoais.
   
Para cuidar das filhas, Tia Betinha, ficou treze anos afastada do mercado de trabalho. Quando retornou foi trabalhar no Construlimp,  uma associação que trabalha com menores abandonados recolhidos das ruas e com menores infratores, como educadora social. Diz ter sido um trabalho muito árduo e sofrido, pois via que aquelas crianças não tinham nenhuma perspectiva no futuro. A grande maioria não queria se reintegrar a sociedade, fugiam e voltavam para o submundo dos vícios.
Em 1998 sua filha caçula com nove anos é diagnosticada com uma síndrome rara a Síndrome de West (uma forma de eplepsia que causa um atraso psicomotor). Para poder cuidar da filha e para que esta tivesse contato com outras crianças montou uma escolinha em seu quintal. E foi com esse contato com outras crianças que Glauciane (filha especial de Tia Betinha) falou suas primeiras palavras.
   

Tia Betinha alfabetizou grande parte das crianças nascidas na década de 90 aqui da rua onde moramos, incluindo meus dois irmãos . Tentou regularizar a escolinha, mais diante tanta burocracia não conseguiu.
       
Buscou instituições públicas e privadas que trabalhasse com a tão famosa “educação inclusiva”, para poder matricular sua filha especial, sem sucesso. Nenhuma escola aceitava o tipo de deficiência que sua filha tinha.
E foi por esse motivo que decidiu, depois de 26 anos, que concluiu o ensino médio decidiu fazer uma faculdade de pedagogia, para tentar ajudar a filha. Mais nem nesta instituição encontrou respostas as suas questões. Seus professores diziam que ela estava levantando uma bandeira que nem eles saberiam como sustentar, porque não  tinham estratégia para lidar com dita síndrome. Percebeu então que seus esforços não adiantariam e desistiu de coloca-la em uma escola.
Concluiu com muita dificuldade a faculdade porque nos últimos anos o estado de saúde de sua filha se agravou e ela ficou internada durante um ano. Dividindo seu tempo entre o trabalho, a faculdade, o hospital e a família. Tia Betinha pode contar sempre com o apoio, a compreensão e o afeto de seu marido que tanto a incentivou a não desistir dos seus sonhos.
   
Assim como ela, desejo concluir meus estudos voltando-me para uma educação inclusiva. Onde todas as crianças , tenha ela uma deficiência ou não, tenha uma educação de qualidade e sem discriminação.
Dois anos apos sua formatura na faculdade Tia Betinha perde Glauciane. Mais esse acontecimento só faz crescer seu amor em ensinar.
Clarice Elisabeth dá aula pro ensino fundamental no Colégio Meu Futuro desde 2005,e ainda tem o sonho de construir sua própria escola, pelo simples fato de amar ensinar.
“A educação é amor, se não tiver amor você não será um educador.”
“Se você visa ficar rico na educação, você não vai ficar.”
       
Por: Ana Paula Esteves
            

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